quarta-feira, 10 de março de 2010

Gratidão


Eu poderia falar das milhares de coisas que abri mão, desde o dia em que soube que o Klauss morava dentro de mim. A carreira de pesquisadora que foi pro beleléu; as viagens internacionais, Grécia, Roma, toda Europa; as pessoas que não conheci, os livros que não li, as paixões que não vivenciei.

Foram tantas e tantas coisas grandes e ínfimos detalhes que a maternidade me furtou... E não dá para citar um a um. Eu já nem sei mais quantas trocas de sentimentos fiz para atender à minha maternidade.

E ainda hoje, tenho privações que não teria se não fosse mãe ou se pelo menos não tivesse tido filho tão cedo, recém formada, recém casada e aos 23 anos de idade.

Ainda não posso sair sempre que quero, assistir os filmes que gostaria e sempre sou interrompida quando consigo trazê-los pra casa. Não posso freqüentar a minha sonhada academia e não só engordei pra caramba nas gestações, como não posso me exercitar como eu preciso, o que me deixa muito angustiada.

Não posso namorar meu marido tanto quanto gostaria, porque teriam que envolver outras pessoas num cuidado que acredito ser nosso e também porque não quero incomodar.

Enfim, abri mão de uma vida para ser mãe.
Mas o que ganhei em troca foi muito mais profundo do que jamais poderia imaginar.

Concordo que talvez eu tenha sido mãe cedo demais. Porém agora vejo que até isso foi milimetricamente calculado pelo universo para que eu me tornasse quem sou.

Gerar um ser humano, alimentar, educar e amar esta pessoa que pode ser um presidente – ou um marginal – é de uma relevância sem igual. Criar esse espírito que tem o livre arbítrio para fazer toda a diferença e até mudar o mundo para muito melhor, não pode ser uma missão de segunda categoria.

Mas o melhor de tudo é o que fazemos para nós mesmas quando abrimos mão de uma vida independente para ter uma vida livre através do amor.

Os filhos trazem muito mais do que a maternidade, noites em claro e preocupação, quando permitimos. Os filhos trazem humanidade pros pais. Me sinto muito mais humana, viva, sábia, forte, profunda e até mais bonita.

Então o que perdi é infinitamente menor do que ganhei. Minha vida não é como sonhei, mas não tenho do que me queixar. Ainda me sinto tão menina... E sempre sentirei.

As vezes parece que fui tirada da adolescência direto pra cá e me pergunto se tenho competência, inteligência e merecimento para ser mãe desses dois presentes, esses dois espíritos tão alegres e maduros que surgiram em minha vida.

No fundo, de alguma forma sei que foram eles que me escolheram por algum bom motivo e isso me dá a segurança que preciso para saber que sou sim good enough.

Nada que eu tenha deixado para trás poderia ter sido mais emocionante e intenso do que receber - suada e extasiada - um filho nos braços. Nada que eu possa fazer, pagará todo amadurecimento e a experiência de amor que tive.

Não sinto apego, mas um desejo muito grande de ser sempre a melhor amiga deles.
Quero ser o que não tive e o que nunca fui.

Este texto foi para dizer que toda vez que abrimos mão de algo, imediatamente outro caminho é colocado em nossa frente e este é sempre melhor do que o que escolhemos. Mesmo que não pareça.
Escrevi isto para dizer que não entendo mães que se arrependem de terem tido filhos, apesar de respeitá-las, porque ser mãe me trouxe uma imensa satisfação e até mesmo uma melhor relação com o mundo.

Hoje quero este mundo melhor porque eles o fazem valer a pena. Desejo ser melhor para atender suas expectativas e ter condições de conduzi-los bem. Preciso fazer a vida perfeita para que eles esperem sempre o belo e o certo.

Me sinto uma devedora daquelas duas coisinhas tão pequenas e tão grandes. Estou conformada de que nada que faça será o suficiente para quitar esta dívida moral que tenho com eles.

E a isto costumo dar um nome. Dar o nome do sentimento mais bonito e nobre: gratidão.